Friday, November 30, 2012

Porque eu gosto das discussões com frango a passarinho



De duas, uma: ou eu tenho tido muita sorte com os filmes franceses que tenho assistido; ou o cinema francês é mesmo de grande qualidade e bom gosto. Provavelmente um pouco dos dois. Mas suspeito que mais do segundo do que do primeiro.

O que mais me interessa no cinema francês é o elemento surpresa e inesperado no desenrolar da história. Em comparação com os filmes hollywoodianos, os franceses nos dão menos garantias do que vai acontecer no final, e assim temos a oportunidade de viver a trama de maneira mais emocionante e intrigante. Uma revira-volta é sempre possível; um final menos feliz também. Além disso, os personagens dos enredos franceses são geralmente menos óbvios, e suas complexidades são muitas vezes reveladas de maneira criativa: algo que pode ir do dramático ao cômico, passando algumas vezes pelo poético.

Um filme que acabo de assistir e que eu certamente recomendo é “Le Prénom”. O filme é recheado de discussões interessantíssimas entre cinco amigos: dois casais e um homem solteiro. Como o filme se passa quase por completo dentro da sala de estar de um dos casais, e com um foco especial nos diálogos, a impressão que se tem é que você está assistindo a uma peça de teatro. Na verdade, eu não me surpreenderia em descobrir que o filme seja uma adaptação do teatro.

A partir da primeira discussão do filme, que gira em torno da escolha do nome do bebê que um dos casais está esperando, muitas outras discussões se desenrolam. Tais discussões vão mostrando as complexidades de cada um dos personagens, e os pontos de conflitos no (inicialmente) harmonioso grupo de amigos. A tensão das discussões vai despindo os personagens, confrontando as suas mazelas e frustrações pessoais. Vai trazendo verdades à tona. E suscitando, por muitas vezes, um clima de caos. Clima esse que vai tornando os personagens mais honestos, diretos, crus e verdadeiros.

Tudo isso me fez lembrar de uma outra inflamada discussão entre amigos; uma discussão que eu tive com dois grandes e velhos amigos no verão passado. O clima era de cordialidade e de férias; a cena paradisíaca: sentados à beira de uma praia quase deserta em Ilha Grande. Tudo isso regado a cerveja, caipirinha, e frango a passarinho. Até que, num momento, um ponto de conflito e desentendimento se manifestou. E a discussão que se seguiu foi no mínimo exaltada. Na descrição de um dos dois amigos presentes, eu estava alteradíssimo, comendo frango a passarinho e soltando espuma pela boca de tanta raiva. Descrição que provavelmente está bem próxima do que realmente aconteceu.

Durante a discussão, tudo parecia um pesadelo. Hoje eu dou até risada, e me lembro com certo saudosismo e carinho daqueles momentos exaltados. Ouso até dizer que eu gostaria de ter mais discussões como aquela. Tais discussões podem ser mais reveladoras e reconciliadoras do que dezenas de jantares harmoniosos. Por isso mesmo é que eu gosto das “discussões com frango a passarinho”.

30 de novembro de 2012

Eduardo Costa



Fonte Figura: https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgeestmx5BEqkyyqTJPq9X7xjagGgn2HNymP94ZY-IeJyySESRqWaZay3Di6zsBsM2iTFT6m8vmpkDfyQMGobx44ZcDQzcxslYKRnYdfNCC3-sHNQnBtjKZUraMzJBKbbP0VehU/s1600/frango+a+passarinho.jpg


No comments: