Eu estou convencido que os anos fazem bem para muitas pessoas. Apesar dos temidos cabelos brancos e dos pés de galinha, a maioria das pessoas que eu conheço tem se tornado mais interessante e atraente no seu rumo aos 30 e início de jornada ao 40, do que no auge dos seus 20 anos. Afinal, além das marcas de expressão, o tempo também pode nos presentear com um pouco mais de equilíbrio, sobriedade, auto-conhecimento, segurança, coragem.
Entretanto, contudo, todavia.... o tempo trás outras coisas na bagagem; muitas delas menos criticadas que o envelhecimento, e menos divulgadas que o amadurecimento. O tempo também traz uma certa amargura, por exemplo. Ou seja lá como você gosta de chamá-la. Seletividade, alguns diriam. Bom gosto, outros diriam. Eu continuo com a palavra "amargura".
Mas eu uso aqui amargura num sentido bem específico: a amargura de quando a gente vai perdendo a capacidade de apreciar certas coisas devido às experiências acumuladas nas rodovias da vida, às frustrações, aos desgostos, às mentiras que nos contaram, aos abusos que sofremos, ao tempo que nos roubaram, às nossas antigas verdades que deixamos para trás.
Mas para deixar as coisas menos abstratas, deixe-me dar um exemplo. No auge dos meus 19 anos eu ia na biblioteca da Unesp emprestar os videos do grupo gospel Diante do Trono para assistir em casa. Eu gostava tanto. Assistia e ficava todo emocionado; era quase "arrebatado". Mas os anos foram se passando, e a minha identificação com a visão ministerial do Diante do Trono foi ficando menor. Um certo preconceito foi crescendo em meu peito e um distanciamento foi sendo criado. Eu fui me amargurando em relação a grupos "a la Diante do Trono"; já não havia mais identificação. Grupo Hill Song? Ouvi falar já na minha época de amarguramento, e nunca tive muito interesse de saber mais sobre grupo. O máximo que fiz foi ter contato com algumas músicas deles pelo fato delas serem utilizadas com tanta frequência nas igrejas evangélicas ultimamente.
É claro que eu não tenho obrigação de gostar do Diante do Trono, assim como eu não tenho obrigação de gostar de futebol ou saber sambar (se bem que eu gostaria de saber sambar). A amargura começa quando a gente se fecha para um certo grupo (ou uma certa parcela da sociedade, uma certa atividade, um certo pensamento, etc.) a um certo ponto que perdemos a capacidade de extrair qualquer coisa que seja de bom daquilo em relação a que somos amargos. É como se porteiras fossem criadas no nosso cérebro e coração; porteiras que em certo sentido nos mantem separados de qualquer influência, seja ela positiva ou negativa, do nosso alvo de amargura. Perdemos o interesse, criamos preconceitos, nos tornamos indiferentes, demasiadamente críticos.
O facebook é um ótimo campo de estudo para a análise da amargura alheia. Sobra amargura enrustida. Amargura religiosa, amargura política, amargura militante, amargura burguesa, amargura branca, amargura negra, amargura hétero, amargura gay, amargura machista, amargura feminista, amargura conservadora, amargura liberal, amargura cultural, amargura racial... amargura, amargura... e um pouco mais de amargura.
A amargura não nos faz necessariamente pessoas amargas. Ela (só) nos fecha um pouco do mundo de possibilidades que temos; ou melhor: que teríamos. Elas nos cega um pouco, e nos ensurdece um pouco também. Nos limita, mas na maioria das vezes não nos mata.
Mas enfim.
E você, também está se amargurando?
26 de novembro de 2012
Eduardo Costa
Fonte figura: https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhDCrSuP7CRQA5wYjSC8suoFz_YIUTvP1X7FRPIL2c08mmWj13FalRmnedW5I1ottlp1qvgTWGyYrKf4Dj3SBAS05fP214ENwyxTXISFCNW5_hT5vn37Q3DA-ONTJq6j3SXOvkRvw/s1600/amargura.jpg
No comments:
Post a Comment