"Eu acho que essa COCA é FANTA"
A cada declaração, video ou entrevista do Deputado Marcos Feliciano, minha antipatia e indignação com relação às suas posições políticas e ideológicas crescem em ritmo acelerado. E não me comove nem um pouco que ele nele seja canalizado todo o descontentamento público em relação à maneira desastrosa que a bancada evangélica e outros setores conservadores abordam temas como o combate à homofobia. Como diria uma amiga minha, "É pouco até".
Mas tem uma coisa que está me incomodando profundamente. Muitas pessoas têm questionado a sexualidade do deputado como uma maneira de denegrir a sua imagem, ou de colocá-lo em uma situação vexatória. Nessa semana, por exemplo, o ator Alexandre Frota trouxe os apresentadores de um programa de TV aos risos ao debochar que ele teria tido um relacionamento com o Feliciano. Na verdade, Frota só reproduziu uma atitude que já é vista há muito tempo em redes sociais.
Mesmo que feita com boas intenções, declarações como essas trazem um raciocínio perigoso e precisamos estar atentos para isso.
Primeiro, tais declarações mantêm o alvo das críticas, mas desvirtua os argumentos. Existem inúmeros fatos públicos que deslegitimam o Feliciano como um representante das minorias. Os discursos preconceituosos e opressores do deputado, a sua articulação política e o seu compromisso com o poder são mais do que suficiente para fundamentar nossas críticas e protestos contra ele. Então não vejo porque a necessidade de tentar se fazer insinuações sobre a sua vida privada. Ainda mais quando tais insinuações são sobre coisas que não dizem respeito à população.
Segundo, tais declarações trazem a homossexualidade para o campo do deboche e do xingamento. Ao pensar que alguém deva se sentir ofendido por chamá-lo de homossexual, está-se também reproduzindo a idéia opressora e cruel que a homossexualidade seja um motivo vexatório, uma condição inferior à heterossexulidade, algo negativo na vida de um indivíduo. É um discurso que reforça o preconceito e dissemina uma homofobia camuflada, mesmo nos meios gays. E se você não concorda comigo, me responda quantas vezes você viu um crítico do deputado Jean Wyllys o "xingando" de heterossexual.
Terceiro, tais declarações revelam um prazer sádico em rotular as pessoas com respeito à sexualidade. Expressões como "Essa coca é fanta" e "Essa pessoa não me engana" revelam essa nossa atitude de impor que cada encontre a sua definição em nosso dicionário e viva de acordo com o que se é esperado dela. Enquanto que, na verdade, a sexualidade é só um elemento na vida de um indivíduo e a parte não deve sobrepor o todo. Além disso, a maneira como cada um escolhe vivenciar a sua sexualidade só diz respeito à pessoa em si e às pessoas que eventualmente estejam envolvidas na situação. Não devem existir protocolos de comportamento. O que deve existir é o respeito à liberdade do outro.
Por fim, como muito bem observou alguém que eu conheço, se você está achando que ao chamar o Feliciano de "homossexual enrustido" você está fazendo um bom papel à sociedade, você está fazendo isso errado. O "xingamento" traz a mensagem que "estar no armário" é motivo vexatório, e só contribui para aumentar a opressão na vida das pessoas que se angustiam com a sua sexualidade. Cada pessoa tem o seu tempo, as suas lutas e os seus questionamentos. E nem todo mundo cabe dentro de uma caixa de sapato.
Coca? Fanta? Sprite? Não dou a mínima, não estou interessado em saber. O Feliciano não me representa, e isso não tem nada a ver com a sexualidade dele.