Sunday, July 24, 2011

O dia em que eu enganei Afrodite



Como já diria um poeta

Mundo velho e decadente mundo
Ainda não aprendeu a admirar a beleza”

E não, não aprendeu mesmo,

não, não aprendeu ainda


O outro poeta retrucaria

“As feias que me desculpem,

mas a beleza é fundamental”

Mas que beleza?

A verdadeira ou aquela que a gente quer comer?


Talvez a verdade seja mesmo que

“quem ama o feio, bonito lhe parece”

como a sabedoria popular de algum popular bradaria.

Mas divagará mesmo o amante sobre isso

enquanto suspira na espera pelo seu ser amado?


Até quando a deusa da beleza irá nos aprisionar?

Até quando trabalharemos para ela e

aceitaremos os seus palpites apetitosos?

Até quando seus palpites com entrada, prato, vinho e sobremesa

e com aceno do garçom na saída?


Ontem eu saí para espiar o mundo

por descuido esqueci de avisar para onde ia

Nem mesmo me dei o trabalho de me avisar

E no meu descuido sonolento tropecei e mergulhei

no suspiro dos apaixonados


Passeando também ali a verdadeira beleza,

imperfeita e tão bonita, tão verdadeira

Tão azul, tão forte, tão espontânea

tão honesta, doce e inocente

tão diferente, tão interessante


Tão bonita na sua falta da extrema beleza,

e ainda bonita na sua presença de beleza

Mas também tão distraída em sua dança pelo mundo


Veio e se foi, não se apresentou, não se despediu

Sem ao menos acenar para mim,

passou, nem me notou, me encantou

Me libertou


Com certa tristeza nos olhos e um estranho sorriso nos lábios

voltei desapercibidamente do meu passeio pelo mundo

E dormi, suspirei, sonhei, debochei

no dia em que enganei Afrodite.


Du (Leuven, 24 de julho de 2011)


Friday, July 01, 2011

A chegada de uma nova estação estudantil


Se tem uma coisa que me impressiona na vida estudantil belga é como cada etapa do ano letivo é bem demarcada. Há tempo para tudo na vida dos estudantes belgas; e cada etapa ou atividade tem o seu período certo e devido. Tudo isso garantido com precisão, é claro, pela agenda sempre a tiracolo de um bom belga.


Mas o que me chama a atenção em tudo isso não é a existência das “estações estudantis” em si, mas a intensidade em que elas são vividas. Por exemplo, os estudantes acabaram de passar por duas etapas bem estressantes: o “bloco” e os exames.


O bloco (traduzindo literalmente do holandês para o português) dura duas semanas e é etapa que precede os exames. Nesse período não há mais aulas e o objetivo é que os estudantes possam acabar de se preparar para os exames. Durante o bloco, uma cidade estudantil como Leuven presencia um progressivo desaparecimento dos estudantes das ruas, bares, praças e parques. É tempo de estudar pesado. Nesse momento não é mais “pecado” ser caxias, bitolado e anti-social.


Mas o nível de stress atinge mesmo o seu pico durante os exames. Durante três semanas todos os estudantes passam a maior parte do tempo ou estudando, ou fazendo exames, ou falando a respeito dos estudos e dos exames. Calendários coletivos são organizados entre amigos, de modo que todos saibam quais exames cada um tem e em quais dias eles caiem. E as conversas sempre giram em torno de como foram os exames já realizados e quantos exames ainda restam até o final.


Mas depois do temporal sempre vem a bonança. E durante a semana passada, um por um, os estudantes de Leuven começaram a aderir o anúncio coletivo do final dos exames e início das férias de verão, a medida que seus calendários de provas se encerravam. E o anúncio, como sempre, vem no seu melhor estilo: evidente, claro e intenso.


Embalados pelo clima mais quente e pelos dias longos, roupas ao estilo “estamos de férias e queremos aproveitar esse tempo” ganham mais uma vez a oportunidade de passear pelas ruas. Amigos e namorados passam horas nos gramados, aproveitando o bom tempo para por o papo e o “bronzeado” em dia, antes de partir de férias. As estações de trem ficam cheias de “jovens mochileiros”, que começam as suas viagens de férias, ou que se encaminham para os famosos festivais de música, munidos de suas barracas e rostos cheios de animação e disposição. É tempo de férias.


Só de ver toda essa animação meu peito já começa a saltar, e penso que gostaria de partir de férias com bons amigos. Mas, enquanto aguardo pelas minhas férias, que ainda vão demorar um pouquinho, sigo animado com a animação dos estudantes aqui e sua maneira tão intensa de comunicar que também há tempo para se aproveitar a vida.


Du

Bruxelas, 01 de julho de 2011


(Foto: Fonske - estátua construída em 1975 para comemorar o aniversario de 550 anos da universidade KULeuven. A estátua representa um estudante que, através da leitura do seu livro, adquire sabedoria, representada pela água que jorra para dentro de sua cabeça.)